Uma mulher de 35 anos ficou mantida em cárcere privado durante 17 anos em Aquidauana e Anastácio, onde morou com o marido, um militar do Exército Brasileiro de 57 anos. A vítima era impedida até mesmo de ver ou falar com os seus familiares. As informações sobre o caso foram divulgadas nessa segunda-feira (30), mas a libertação da vítima aconteceu ainda no mês passado.
Segundo a ocorrência, o casal se conheceu e passou a morar junto há 17 anos, no Amazonas, onde a vítima morava com os pais. O marido foi transferido para Aquidauana e foi nesse momento que a mulher passou a ser proibida de se comunicar com os familiares. A justificativa para isso não está esclarecida.
Além de não poder se comunicar com os parentes, a vítima era castigada, humilhada e ameaçada pelo companheiro. Segundo o depoimento, houve uma situação que chegou a ficar por sete dias sem poder tomar banho, pois o militar não permitia. O marido a obrigava tomar medicamentos fortes para que pudesse ficar dopada.
Com a falta de comunicação, os familiares passaram a desconfiar de que alguma coisa teria acontecido e investigaram o caso, descobrindo o cárcere. O pai da mulher tentou libertá-la no primeiro momento, durante uma visita à sua residência, mas o militar não permitiu que a esposa fosse embora com os seus filhos. Por isso, ela decidiu ficar na casa.
Para evitar que a situação fosse levada às autoridades, o militar ameaçava, dizendo que, se isso acontecesse, a mulher iria perder a guarda dos filhos, pois ele é militar, enquanto ela não “era nada”. Após a tentativa, o militar levou os filhos e a esposa para a Bolívia, numa viagem de motorhome. Os familiares dela ficaram sem notícias durante quatro meses.
Algum tempo depois, o casal se mudou para Anastácio, cidade vizinha de Aquidauana. No novo endereço, a vítima passou a ser proibida de sair de casa e de falar com os familiares, sendo que o telefone celular dela era monitorado pelo militar. No Amazonas, um parente ficou sabendo do Promuse (Programa Mulher Segura) em Mato Grosso do Sul.
O programa realiza o monitoramento e a proteção das mulheres em situação de violência doméstica e familiar. Com a ajuda de uma colega de trabalho, ele entrou em contato, denunciando a situação, investigada a partir de então pelo 7° BPM (Batalhão da Polícia Militar) de Aquidauana.
Uma força-tarefa foi elaborada para resgatar a vítima. Primeiramente, os policiais descobriram o endereço e, juntamente com o CRAM (Centro de Referência de Atendimento à Mulher), foram até o imóvel, onde constataram que a mulher não queria atendê-los, pois tinha medo de policiais, achando que iriam tomar seus filhos.
Um dos integrantes da equipe informou à vítima que a mãe dela é quem teria mandado os policiais. Diante disso, ela foi até o portão e os servidores notaram que estava tremendo e sob efeito de remédios. Na casa, foi percebido uma situação insalubre. Na conversa, foi dito que a mãe dela iria mandar recursos para ela poder ir embora para o Amazonas.
Entretanto, naquele momento o marido tinha saído da casa junto ao filho caçula e negou ir embora mais uma vez, mesmo com a filha de oito anos pedindo. Uma policial militar conversou com a mãe da vítima e orientou que fosse até Anastácio para convenser pessoalmente a vítima.
Para isso, as equipes ficaram cerca de um mês em contato com os familiares até estes chegarem ao Mato Grosso do Sul, após viajarem uma distância de 2.100 quilômetros, com custos de R$ 17 mil. Ao chegar, a mãe e um dos irmãos da vítima foram até a residência, onde, após a conversa, o marido deixou a mulher ir embora, mas sem o filho de 6 anos.
Diante da recusa, uma policial militar que estava acompanhando eles, explicou que, mesmo o homem sendo pai e não ter registro de boletim de ocorrência em seu desfavor, a mãe tem o direito de viajar e levar os filhos. Após isso, o militar cedeu e a vítima foi encaminhada para a delegacia, fez o boletim de ocorrência e pediu medida protetiva.
A vítima e os familiares ainda precisaram ficar por uma semana em um hotel da cidade devido ao alto custo das passagens de retorno ao Amazonas. Durante o resgate foi observado pelas autoridades que o motorhome estava lotado de mantimentos e roupas, apontando que estaria prestes a sair da cidade. Não há informações se o autor foi preso.