22/12/2014 10h00
Ex-funcionários acusam TIM de humilhar e repreender quem vende chip pré-pago
R7
Gerentes da operadora TIM estão obrigando seus funcionários a entrarem em uma campanha agressiva para a captação de novos clientes pós-pagos, com direito a humilhações e punições a vendedores, e até mentiras para os consumidores. O objetivo é reduzir as vendas de produtos que não geram comissão — em especial os chips pré-pagos — e aumentar as vendas comissionadas, sobretudo dos chips pós-pagos.
Além de estímulos comuns ao setor comerciário, como festas e premiações aos vendedores destacados, também são feitas manobras que envolvem humilhação em reuniões e congressos, perda de folgas e até transferências forçadas para unidades longe de casa daqueles que insistem em vender os produtos não comissionados.
As denúncias foram enviadas ao R7 por dezenas de ex-funcionários da TIM, após a publicação de uma reportagem em que um consumidor é agredido por uma funcionária da empresa por filmar o atendimento.
Esses ex-funcionários — alguns dos quais com processo contra a empresa na Justiça do Trabalho em São Paulo — explicam que a venda de produtos não comissionados não ajuda a empresa a crescer no mercado. Por isso, o “vale tudo” leva os funcionários a mentir, ludibriar e não respeitar as necessidades do consumidor de olho em festas, passeios e regalias, além do medo de ser exposto e humilhado.
Em meio a essa pressão, o funcionário mais valorizado é aquele que consegue convecer um cliente que entra na loja com planos de comprar um chip pré-pago, mas sai com um pós-pago. Quem não consegue fazer essa “conversão” e se destaca na venda de chis pré é chamado, pejorativamente, de “bottom”.
Os “bottons”
Uma das humilhações vividas pelos funcionários da TIM faz parte de uma campanha chamada “Zero Bottom”. “Bottom” é como são chamados os funcionários que vendem muitos chips pré-pagos. A campanha é uma tentativa de zerar a venda de produtos não comissionados, migrando de forma forçada os clientes pré-pagos para pós-pagos por falta de opção.
“Mandavam a gente mentir que não tinha chip avulso para convencermos o cliente a se tornar pós-pago, mesmo que seja contratando uma linha controle [com valor fixo por mês]”, afirma uma ex-funcionária, que não quis se identificar porque tem uma ação trabalhista contra a operadora na Justiça.
— No final do dia ou nas reuniões matinais, os funcionários que tivessem vendido muitos chips pré-pago, por exemplo, eram humilhados e sofriam ameaças como transferência para lojas longe de casa.
De acordo com os ex-vendedores, por anos foi usado o “farol de bottom”, que indicava qual a média de produtos que estavam sendo vendidos. Quantos mais conversões de pré para pós-pago, era dado um broche verde. Se estava em uma média aceitável para o gerente, era dado um broche na cor amarela. E aquele que tivesse passado do limite na venda de chips pré usava um broche vermelho.
— Mesmo o cliente não sabendo o que significava, era uma coisa humilhante. Enquanto quem tinha o vermelho era criticado, os funcionários que ganhavam os verdes (chamados de “tops” ou “lobos”) iam para festas vips de Camaro e tinha regalias, como folgas. Então muito vendedor não queria nem saber o que o cliente precisava, só queria saber de vender e converter o cliente para pós-pago. O medo de vender chip pré era tão grande que já chegaram a cadastrar várias linhas no meu sistema, que por descuido deixei aberto.
A campanha para zerar os “bottons” foi inclusive divulgada, em 2012, na página do Facebook de uma ex-gerente de canal, que se desligou recentemente da empresa. Pela rede social, outros então funcionários mostraram apoio à campanha.
De acordo com os ex-funcionários, o “farol de bottom” não é mais usado, porém a campanha continua dentro das lojas.
Outras humilhações
A lista de denúncias de humilhação é extensa. Por isso, todos os funcionários que entraram em contato com o R7 têm processos trabalhistas em andamento.
Os relatos de constrangimento também se estendem a metas de vendas de outros produtos. Como é o caso de uma campanha para a venda de modens de internet. Ex-funcionários contam que o funcionário que não conseguisse vender o aparelho em um dia, no dia seguinte teria que trabalhar com o modem pendurado no pescoço.
“Esses são apenas alguns exemplos do que passamos como vendedores da TIM. As sessões de humilhação constantes e o incentivo para vender algo que o cliente não teria condições de pagar é uma rotina na vida dos vendedores”, disse outro ex-funcionário, que também não quis se identificar por temer represálias.
— Quem for em uma loja pode pedir que chip pré-pago não falta, o que falta é respeito com o consumidor.
Ainda relacionado ao modem, que custa em média R$ 100 ao cliente, uma ex-funcionária afirma que os celulares chegavam às lojas com um determinado preço, mas o valor do modem era incorporado ao valor do celular. O “combo” então era vendido como se o modem fosse gratuito.
— A venda do combo era uma meta. O celular saia sempre R$ 100 mais caro, porque, na verdade, o consumidor estava pagando pelo aparelho.
Demissão por justa causa
Os ex-funcionários decidiram expor os problemas da TIM após a demissão, por justa causa, de cerca de 200 funcionários. As demissões ocorreram na região metropolitana de São Paulo ao longo de todo o ano de 2014.
Muitos dizem que só conheceram os motivos da dispensa após abrirem processos trabalhistas na Justiça. Eles contam que foram acusados pela empresa de fraude, em razão da ativação de linhas telefônicas “fantasma”, sem nenhum cliente. Segundo explicam, no entanto, as supostas fraudes aconteciam com o conhecimento de gerentes e outros superiores.
O caso é semelhante ao que ocorreu no ano passado em Goiás, quando a TIM foi obrigada pela Justiça a converter “justa causa” em “dispensa imotivada”, após a Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO) decidir que os funcionários que ativavam “linhas fantasmas” tinham respaldo dos superiores. A falta de comprovação do dolo (da intenção de causar dano) terminou na conversão da dispensa de justa causa, permitindo aos funcionários receberem as verbas rescisórias.
“É exatamente isso que aconteceu com a gente [aqui em São Paulo]. Ninguém fez nada dentro da loja que os gerentes não soubessem”, explica uma ex-funcionária.
O que diz a TIM?
A TIM considera inadmissível qualquer tipo de prática irregular de negócios por parte de seus funcionários ou de parceiros. Quando alguma irregularidade é identificada, a empresa, imediatamente, toma as providências necessárias e age de acordo com as leis e com as previsões contratuais, inclusive podendo se deparar com a necessidade de efetuar desligamentos por justa causa ou descontinuar sua relação com um fornecedor. As eventuais fraudes geradas por supostas orientações superiores não beneficiam de nenhuma maneira a empresa, levando-a, até mesmo, a graves prejuízos.
A TIM esclarece ainda que, em nenhum momento, restringiu ou orientou suas equipes de vendas a limitar a comercialização de qualquer produto de seu portfólio. A operadora é líder nacional no mercado pré-pago – com mais de 62 milhões de usuários nesse segmento – e respeita sua base de clientes, em prol da excelência no atendimento ao cliente. Por isso, investe na capacitação contínua da força de vendas. Somente em 2014, a empresa registrou 200 mil horas de treinamento para o time de vendas, reforçando o compromisso da companhia com o bem-estar e o desenvolvimento dos seus colaboradores e com a satisfação dos consumidores.
A empresa, adicionalmente, informa que tem como política fundamental valorizar o desempenho das equipes e estimular o compartilhamento de melhores práticas entre seus colaboradores. Os resultados dos programas de incentivo desenvolvidos pela TIM são comunicados internamente e de forma transparente, visando reconhecer e premiar os melhores desempenhos, sempre em linha com suas diretrizes éticas e operacionais. A operadora aproveita para reiterar que mantém, divulga e obedece a um Código de Ética e Conduta bastante rígido e possui um robusto procedimento sigiloso de denúncias de comportamentos irregulares, abrangendo todo os níveis hierárquicos e áreas da empresa.