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sexta-feira, 25 de abril, 2025
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Papa Francisco se despede com mensagem de fé e esperança

Na manhã desta segunda-feira (21), o mundo desperta sob a comoção da notícia da morte do Papa Francisco. A despedida do pontífice argentino vem acompanhada de uma mensagem de fé e esperança, deixada em sua última homília escrita para a Páscoa. Mesmo debilitado e impossibilitado de celebrar pessoalmente a tradicional Missa na Praça de São Pedro, no domingo (20), Francisco preparou um texto profundo e simbólico, que ecoa agora com ainda mais força diante de sua partida.

Não podemos estacionar nosso coração nas ilusões deste mundo, nem fechá-lo na tristeza; temos de correr, cheios de alegria“, escreveu o Papa em sua homília Urbi et Orbi, lida pelo Cardeal Angelo Comastri, arcipreste emérito da Basílica de São Pedro. A frase, marcada por leveza e urgência espiritual, tornou-se o último chamado de Francisco à humanidade.

Inspirado pelo Evangelho da Ressurreição, Francisco destacou o “correr” de Maria Madalena, Pedro e João ao descobrirem o túmulo vazio. Para ele, esse gesto não era apenas físico, mas expressão de uma fé viva, que impulsiona à busca contínua por Cristo — não entre os mortos, mas no cotidiano, no rosto dos irmãos, nas pequenas alegrias da vida.

“Cristo ressuscitou, está vivo! […] Não podemos fazer dele um herói do passado ou pensar nele como uma estátua colocada na sala de um museu”, afirmou. “Temos de nos pôr em movimento, sair para O procurar […] em todo lugar, exceto naquele túmulo.”

O Papa, que vinha enfrentando problemas de saúde, incluindo uma pneumonia bilateral, surgiu brevemente na varanda da Basílica após a celebração de domingo, saudando os fiéis. Foi seu último gesto público, em contraste com a intensidade da mensagem que deixaria registrada como testamento espiritual.

A homília também refletia o espírito do próximo Jubileu, previsto para 2025, convocando os fiéis à renovação da esperança. “Afastai de nós, ó Deus, a poeira triste da rotina, do cansaço e do desencanto; dai-nos a alegria de acordar, a cada manhã, com os olhos maravilhados”, escreveu Francisco, citando o teólogo italiano Adriana Zarri.

Com sua morte, Francisco deixa mais do que uma obra pastoral; deixa um legado espiritual de simplicidade, misericórdia e fé em movimento. “Convosco, Senhor, tudo é novo. Convosco, tudo recomeça”, escreveu, encerrando uma trajetória marcada por humanidade e transformação.

Hoje, o mundo inteiro corre — em oração, em silêncio, em lágrimas — para reencontrar, nas palavras do Papa, o Cristo vivo. E, talvez, reencontrar também a si mesmo.

Homília de Páscoa

Maria Madalena, ao ver que a pedra do sepulcro tinha sido removida, começou a correr para ir avisar Pedro e João. Também os dois discípulos, tendo recebido aquela surpreendente notícia, saíram e – diz o Evangelho – «corriam os dois juntos» (Jo 20, 4). Os protagonistas dos relatos pascais correm todos! E este “correr” exprime, por um lado, a preocupação de que tivessem levado o corpo do Senhor; mas, por outro lado, a corrida de Maria Madalena, de Pedro e de João fala do desejo, do impulso do coração, da atitude interior de quem se põe à procura de Jesus. Ele, com efeito, ressuscitou dos mortos e, portanto, já não se encontra no túmulo. É preciso procurá-lo noutro lugar.

Este é o anúncio da Páscoa: é preciso procurá-lo noutro lugar. Cristo ressuscitou, está vivo! Não ficou prisioneiro da morte, já não está envolvido pelo sudário e, por isso, não podemos encerrá-lo numa bonita história para contar, não podemos fazer dele um herói do passado ou pensar nele como uma estátua colocada na sala de um museu! Pelo contrário, temos de O procurar, e, por isso, não podemos ficar parados. Temos de nos pôr em movimento, sair para O procurar: procurá-lo na vida, procurá-lo no rosto dos irmãos, procurá-lo no dia a dia, procurá-lo em todo o lado, exceto naquele túmulo.

Procurá-lo sempre. Porque se Ele ressuscitou, então está presente em toda a parte, habita no meio de nós, esconde-se e revela-se ainda hoje nas irmãs e nos irmãos que encontramos pelo caminho, nas situações mais anónimas e imprevisíveis da nossa vida. Ele está vivo e permanece sempre conosco, chorando as lágrimas de quem sofre e multiplicando a beleza da vida nos pequenos gestos de amor de cada um de nós.

Por isso, a fé pascal, que nos abre ao encontro com o Senhor ressuscitado e nos dispõe a acolhê-lo na nossa vida, é tudo menos uma acomodação estática ou um pacífico conformar-se numa segurança religiosa qualquer. Pelo contrário, a Páscoa põe-nos em movimento, impele-nos a correr como Maria de Magdala e como os discípulos; convida-nos a ter olhos capazes de “ver mais além”, para vislumbrar Jesus, o Vivente, como o Deus que se revela e ainda hoje se torna presente, nos fala, nos precede, nos surpreende. Como Maria Madalena, podemos fazer todos os dias a experiência de perder o Senhor, mas todos os dias podemos correr para O reencontrar, sabendo com certeza que Ele se deixa encontrar e nos ilumina com a luz da sua ressurreição.

Irmãos e irmãs, aqui está a maior esperança da nossa vida: podemos viver esta existência pobre, frágil e ferida agarrados a Cristo, porque Ele venceu a morte, vence a nossa escuridão e vencerá as trevas do mundo, para nos fazer viver com Ele na alegria, para sempre. Em direção a esta meta, como diz o Apóstolo Paulo, também nós corremos, esquecendo o que fica para trás e vivendo orientados para o que está à nossa frente (cf. Fl 3, 12-14). Apressemo-nos então a ir ao encontro de Cristo, com o passo ligeiro de Maria Madalena, Pedro e João.

O Jubileu convida-nos a renovar em nós mesmos o dom desta esperança, a mergulhar nela os nossos sofrimentos e as nossas inquietações, a contagiar aqueles que encontramos no caminho, a confiar a esta esperança o futuro da nossa vida e o destino da humanidade. Por isso, não podemos estacionar o nosso coração nas ilusões deste mundo, nem fechá-lo na tristeza; temos de correr, cheios de alegria. Corramos ao encontro de Jesus, redescubramos a graça inestimável de ser seus amigos. Deixemos que a sua Palavra de vida e verdade ilumine o nosso caminho. Como dizia o grande teólogo Henri de Lubac, «bastar-nos-á compreender isto: o cristianismo é Cristo. Verdadeiramente, não há nada mais do que isso. Em Cristo temos tudo» (Les responsabilités doctrinales des catholiques dans le monde d’aujourd’hui, Paris 2010, 276).

E este “tudo”, que é Cristo ressuscitado, abre a nossa vida à esperança. Ele está vivo e ainda hoje quer renovar a nossa vida. A Ele, vencedor do pecado e da morte, queremos dizer:

«Senhor, nesta festa, pedimos-vos este dom: que também nós sejamos novos para viver esta perene novidade. Afastai de nós, ó Deus, a poeira triste da rotina, do cansaço e do desencanto; dai-nos a alegria de acordar, a cada manhã, com os olhos maravilhados, para ver as cores inéditas daquele amanhecer, único e diferente de todos os outros. […] Tudo é novo, Senhor, e nada repetido, nada envelhecido» (A. Zarri, Quasi una preghiera).

Irmãs, irmãos, na maravilha da fé pascal, trazendo no coração todas as expetativas de paz e libertação, podemos dizer: Convosco, Senhor, tudo é novo. Convosco, tudo recomeça.

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