Governo nega impactos e aposta desfecho em fevereiro; especialistas apontam receio do mercado e efeitos na gestão pública
O governo entrará em 2025 sem a definição dos gastos para o ano. A negociação de pautas no Congresso, como o pacote fiscal do Ministério da Fazenda, acabou atrasando o calendário e adiou a votação do Orçamento para o ano que vem. A base aliada ao presidente Lula nega que a mudança interfira nos planos do Executivo, mas especialistas consultados pela reportagem apontam que a alteração provoca um cenário de incertezas.
As situações de fragilidade passam pela economia e política, em efeitos que podem ir do impacto em políticas públicas ao receio do mercado. Do ponto de vista de Fernando Barros Júnior, professor no Departamento de Economia da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da USP, o que pesa é a indefinição.
“Geram incertezas. A gente está entrando em um próximo ano em que ainda não se tem uma definição clara do Orçamento, principalmente em um cenário em que já temos um grande problema nas contas. O governo vem acumulando déficits recorrentes, tem uma dificuldade enorme de cortar gastos, tem um apetite grande por aumentar gastos, então, nesse sentido, a gente vê uma grande incerteza”, diz. “O mercado olha tudo isso com um certo receio”, complementa, em outro momento.
O professor destaca que a situação interfere no que se pode esperar de 2025, mas indica que os impactos em projetos podem impedir planos mais elaborados da equipe econômica para os próximos meses.
“Sem a gente ter um orçamento definido, o ano começa meio incerto em como fazer esses gastos. Por um lado, como o orçamento é para o ano todo, no começo do ano você tem um pouco mais de liberdade, o que ainda deve deixar a equipe econômica com alguma liberdade para fazer gastos. Porém, sem essa definição clara, a gente vive num mundo de incertezas e a gente não sabe o que esperar disso”, aponta.
Em outra frente, o cientista político Murilo Medeiros ressalta que a falta de aprovação do Orçamento conduz o governo para executar apenas despesas provisórias, sem uma possibilidade de grandes investimentos a projetos específicos. “Isso pode afetar áreas críticas como saúde, educação e segurança pública. Também provoca imprevisibilidade na gestão pública, gerando incertezas sobre o cumprimento das metas fiscais e descontinuidade de políticas públicas”, destaca o especialista pela Universidade de Brasília.
Medeiros também aponta que a situação provoca um maior custo político ao governo e pode aumentar o desgaste com o Congresso. “O adiamento vai intensificar tensões entre o Executivo e o Legislativo, principalmente na disputa sobre as prioridades orçamentárias. Tal configuração vai acelerar a reforma ministerial e a busca por espaços de poder na próxima direção da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, como a distribuição partidária nas comissões temáticas e o próprio controle da Comissão Mista de Orçamento.”
Mudança no calendário
O adiamento para 2025 frustrou planos dos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). A aliados, o alagoano apontou que o adiamento pode prejudicar o funcionamento da máquina pública. Pacheco, que chegou a levantar a possibilidade de votação até mesmo no sábado para garantir todas as aprovações, também defendia um desfecho em 2024, mas amenizou impactos após a transferência.
“Agora há pouco nós concluímos as votações do pacote de corte de gastos, cujos efeitos são gerados para a Lei Orçamentária. Portanto, natural que o relator e os membros da comissão tenham esse tempo, mas isso aconteceu outras vezes”, afirmou.
A LOA (Lei Orçamentária Anual), que especifica gastos e despesas para o ano seguinte, é decidida em dezembro até antes do recesso parlamentar, como etapa necessária para definir o quanto será aplicado em cada área e a origem dos recursos. O atraso não é inédito, mas será transferido para o futuro comando do Congresso: tanto a Câmara quanto o Senado terão que decidir pelas novas presidências no ano que vem.
Nas expectativas do líder do governo, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), a votação será concluída em fevereiro, o que deve ficar para o final do mês, pela necessidade de votação das novas mesas diretoras. O político também nega impacto nas contas do governo.
Fonte: R7