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sexta-feira, 27 de setembro, 2024
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Análise da Embrapa mostra rio em 11 municípios de MS com 33 agrotóxicos

Uma descoberta, que já poderia ser esperada, mas que alarma ou não pode ser normalizada, foi oficializada por pesquisa realizada pela Embrapa Agropecuária Oeste, que mostra o absurdo da contaminação por Agrotóxicos em um único rio de Mato Grosso do Sul. A análise feita durante 2022, mostra o rio Dourado, que passa por 11 municípios de MS, com ‘poluição’ de 33 tipos de agrotóxicos.

A quantia de veneno dispensado em plantações da Agricultura de exportação do MS, com gigantes terras com soja e outras plantações, já se via a ‘olhos nu’ que poderia causar efeito no Meio Ambiente, mas a realidade pode ser alarmante, pois um único curso de água de Mato Grosso do Sul monitorado no quesito agrotóxico, o Rio Dourados, que corre por 11 municípios, “testou positivo” para este tanto, 33 tipos, de defensivos.

Conforme a Embrapa a pesquisa “Monitoramento dos Resíduos de Agrotóxico em Mato Grosso do Sul”, foi realizada entre janeiro e dezembro do ano passado. Durante este período, 90 amostras de água foram coletadas em três locais do Rio Dourados. O levantamento incluiu análise para 46 tipos de agrotóxicos, sendo encontrados 33. Do total, são 16 herbicidas, sete inseticidas, três fungicidas e sete produtos de degradação.

“O agrotóxico que apresentou a maior concentração individual em amostras de 2022 foi a Atrazina. Enquanto que em 2021, a liderança foi da Bentazona. Conforme a pesquisa, os agrotóxicos detectados em todas as amostras foram atrazina, clorantraniliprole, epoxiconazole e tebuconazole”, registrou a Embrapa.

Contudo, a pesquisa da Embrapa apenas avalia a exposição, identificando  e quantificando os resíduos de agrotóxicos na água. Porém, não trabalha com a parte de efeito ao Meio Ambiente e à saúde humana.

Chuva leva das fazendas para o Rio

O retrato do Rio Dourados também mostra que os maiores valores são observados após grandes volumes de chuva acumulado em dias anteriores. A precipitação lava a terra e a água pluvial chega ao rio. A concentração dos agrotóxicos ainda coincide com o final do ciclo da cultura de verão e início da cultura de outono.

“Uma das principais rotas de transporte dos agrotóxicos para corpos hídricos superficiais se dá pelo escoamento superficial da água sobre o solo, o qual se forma durante os eventos de precipitação. Este escoamento é resultado da parcela da água oriunda das chuvas que não infiltra e, pela ação da gravidade, escoa em direção as cotas mais baixas da bacia, encontrando os corpos hídricos superficiais”, informa o relatório.

O engenheiro-agrônomo Rômulo Penna Scorza Júnior, doutor em Ciências Ambientais e pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste, explica que os agrotóxicos encontrados no Rio Dourados, e que têm VMP (Valores Máximos Permitidos) estabelecidos na resolução 357 do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), estão dentro do limite aceitável. Porém, é uma fotografia 3×4 (aquela pequena dos documentos de identificação).

“Dos 33 agrotóxicos encontrados no Rio Dourados, apenas dois (atrazina e simazina) possuem limites previstos pelo Conama 357”, afirma Rômulo. Ou seja, outros 31 tipos de defensivos correm pelo rio sem ao menos ter um parâmetro mínimo pela legislação ambiental.

Só Rio Dourado

O pesquisador detalha os motivos de o levantamento se concentrar no Rio Dourados. Um deles é financeiro e ilustrativo da dificuldade para fazer pesquisa no Brasil. “Nesse momento, temos disponibilidade de recursos financeiros e humanos apenas para o Rio Dourados. Mas a ideia é estender para outros rios, à medida que conseguirmos mais recursos financeiros e humanos”, diz Rômulo.

O rio também é monitorado pela relevância para o abastecimento de água à população de Dourados, segundo maior município de MS, e por estar inserido em uma bacia hidrográfica com atividade agrícola e uso de agrotóxicos.

Com extensão de 374 km, o Rio Dourados desemboca no Rio Brilhante. No caminho, passa por Antônio João, Ponta Porã, Caarapó, Laguna Carapã, Vicentina, Fátima do Sul, Deodápolis, Dourados, Glória de Dourados, Jateí e Ivinhema.

Água de beber –

A Sanesul (Empresa de Saneamento de Mato Grosso do Sul) informa que 40% da água para abastecer a cidade Dourados é captada no rio. Os 60% restantes vêm dos poços.

Conforme a empresa, que analisou os dois últimos relatórios da Embrapa Agropecuária Oeste, de dezembro de 2019 a dezembro de 2020 e de janeiro a dezembro de 2022, das substâncias pesquisadas apenas três têm previsão legal, como dispões portarias sobre os procedimentos de controle e de vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade.

Os agrotóxicos com definição de Valores Máximos Permitidos são alacloro (não apresentaram resultados nas duas pesquisas), atrazina (valor abaixo do máximo) e simazina (que não apresentou resultados na primeira pesquisa e apresentou resultados menores que o limite de quantificação em 2022).

Já as demais substâncias encontradas na pesquisa dependem de estudos por parte do Ministério da Saúde para estabelecer os riscos e os limites, com  revisão da Portaria de Potabilidade para a inclusão.

“Desta forma, a pesquisa demonstra que não há risco à saúde com o consumo da água distribuída, com as substâncias controladas pela legislação de potabilidade. A Sanesul cumpre rigorosamente os requisitos da legislação ambiental e de potabilidade, monitorando os teores das substâncias na frequência estabelecida com previsão legal”, informa a empresa.

Ponto cego – A exclusividade do Rio Dourados em pesquisa sobre a tipificação dos agrotóxicos presentes nas águas que correm por Mato Grosso do Sul contrasta com os números superlativos das lavouras pelo Estado.

A produção de soja atingiu a marca histórica de 15 milhões de toneladas nesta safra. A produção recorde foi decorrente do aumento de 6% da área plantada, que atingiu os quatro milhões de hectares na safra 2022/2023 e também da maior produtividade por hectare.

O Imasul (Instituto de Meio Ambiente de MS) faz um raio-x de 73 rios no Estado, mas o levantamento não inclui agrotóxicos.

A reportagem questionou a Semadesc (Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação) sobre a possibilidade de pesquisas também verificar a presença dos defensivos, mas não obteve resposta até a publicação da matéria.

Neste ano, levantamento do Instituto SOS Pantanal constatou altos níveis de nitrato e fosfato nos rios Aquidauana, Miranda e Paraguai, cursos de água que chegam ao Pantanal. A expedição “Águas que Falam” foi patrocinada pela Fundação Toyota do Brasil. Já futuras etapas, com mais estudos e aprofundamentos, esbarram no velho problema: será preciso mais dinheiro.

Altas concentrações de nitrato e fosfato em regiões rurais, regiões não tão urbanizadas, são fortes indicadores de agroquímicos e fertilizantes. Que estão sendo carregados do solo para a água, para os rios. Indicativo que tem alta concentração dessas substâncias na água”, afirmou o biólogo Gustavo Figueirôa, diretor de Comunicação e Engajamento do instituto, em entrevista ao Campo Grande News no mês de abril.

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