Um levantamento com base nos dados do Índice FipeZAP revelou que os brasileiros que recebem um salário mínimo precisaram trabalhar, em média, 44 dias para pagar o aluguel em 2024. O estudo considerou o preço médio de locação de um imóvel de 45m² — semelhante aos do programa habitacional Minha Casa, Minha Vida — que custava R$ 2.062,35 no ano passado. Em contrapartida, o salário mínimo vigente era de R$ 1.412.
Apesar do alto impacto do aluguel na renda dos trabalhadores, o estudo aponta uma redução no comprometimento da renda ao longo dos últimos anos. Em 2015, o aluguel de um imóvel com as mesmas características representava 57 dias de trabalho, com valor médio de R$ 1.498,95 e salário mínimo de R$ 788 na época.
Percepção na prática
Mesmo com a melhora apontada pelos números, a percepção da população nem sempre reflete essa redução. O doutor em economia e professor da Universidade Mackenzie, Hugo Garbe, destaca que outros custos essenciais, como alimentação, transporte e energia, aumentaram de forma mais agressiva, anulando os ganhos do aumento do salário mínimo.
“O aluguel pode até ter ficado um pouco mais acessível, mas isso não significa que os brasileiros estejam vivendo melhor”, afirma Garbe.
Dados do Censo do IBGE de 2022 apontam que 20,9% dos brasileiros vivem em imóveis alugados. O especialista em mercado imobiliário Heitor Kuser explica que, para famílias de baixa renda, o aluguel só é viável com a composição da renda familiar. “Quem aluga tem visto valores fora da realidade, portanto, a percepção não é de redução”, avalia.
Oferta de imóveis e valorização
O especialista em setor imobiliário Daniel Claudino aponta que políticas públicas, como o Minha Casa, Minha Vida, ajudaram a aumentar a oferta de imóveis para aluguel. No entanto, ele ressalta que imóveis pequenos, como estúdios e lofts, tiveram forte valorização, especialmente em grandes cidades como São Paulo.
“O Brasil vive um cenário de escassez de imóveis para locação, o que mantém os preços elevados. Além disso, a alta da taxa básica de juros, a Selic, desestimula novas construções e agrava o déficit habitacional”, explica Claudino.
Mudanças culturais e alternativas
Além das questões econômicas, o mercado imobiliário tem sido impactado por mudanças culturais. O Censo de 2022 mostrou que o número de brasileiros que vivem de aluguel aumentou em comparação com 2010, passando de 16,4% para 20,9%. Para Heitor Kuser, as novas gerações preferem a flexibilidade do aluguel em vez de comprometer décadas com o financiamento de um imóvel.
Para driblar os altos custos, muitas famílias têm optado por dividir moradias ou mudar para bairros mais afastados. Hugo Garbe explica que, em alguns casos, a renda é comprometida a ponto de limitar gastos essenciais, como lazer, alimentação e saúde.
Perspectivas para o futuro
Os especialistas acreditam que a situação do aluguel depende do comportamento da economia nos próximos anos. Segundo Garbe, o aumento do salário mínimo acima da inflação e incentivos para a construção de novas moradias podem aliviar o peso do aluguel para os inquilinos.
“O que pode fazer diferença são políticas públicas estruturadas, que facilitem o acesso ao crédito, incentivem novos empreendimentos e melhorem o transporte público, para reduzir a necessidade de morar próximo aos centros urbanos”, conclui o professor.