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domingo, 16 de março, 2025
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Crescimento da produção de alimentos no Brasil desacelera e impacta os preços

Nos últimos anos, o Brasil tem enfrentado uma redução no ritmo de crescimento da produção de alimentos, fenômeno explicado principalmente pelas mudanças climáticas e pelo foco na expansão de culturas voltadas à exportação. A constatação foi destacada na Carta do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV), assinada pelo economista Luiz Guilherme Schymura. A análise aponta que essas condições resultaram no aumento da inflação de alimentos, superando a inflação oficial do país, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do IBGE.

O estudo revela que a inflação dos alimentos tem se distanciado da inflação geral há anos. Entre 2012 e 2024, o preço dos alimentos no domicílio aumentou 162%, enquanto o IPCA geral subiu 109%. No acumulado de 12 meses até fevereiro de 2025, a inflação de alimentos e bebidas foi de 7,25%, acima do índice geral de 4,56%. Esse descompasso entre a alta dos preços da comida e o índice geral é considerado um dos principais desafios para o poder de compra da população brasileira.

Clima, câmbio e exportação

O estudo aponta as mudanças climáticas como um fator crucial para o aumento dos preços. A intensificação de eventos climáticos extremos, como secas e chuvas intensas, tem afetado a oferta de commodities e produtos alimentícios, impactando diretamente a produção interna. Esse fenômeno, que ganhou força a partir dos anos 2000, tem afetado principalmente regiões mais quentes do planeta, como o Brasil.

Além disso, a desvalorização do real tem gerado incentivos à exportação. Com o câmbio mais baixo, os produtores brasileiros preferem vender para o exterior, recebendo em dólar, o que aumenta a lucratividade. Isso, por sua vez, contribui para o aumento do preço dos alimentos, uma vez que a oferta interna é reduzida. O aumento do preço dos insumos agrícolas importados, como fertilizantes e defensivos, também exerce pressão sobre os custos de produção.

Mudanças no uso da terra e a oferta de alimentos

O Brasil tem direcionado parte significativa de suas terras agrícolas para a produção de soja e milho, culturas voltadas principalmente à exportação. A análise revela que, entre 2010 e 2023, a área plantada aumentou de 65,4 milhões de hectares para 96,3 milhões de hectares, sendo a maior parte destinada às culturas de exportação. Em contrapartida, a área destinada a alimentos como arroz e feijão caiu consideravelmente, com uma redução de 20% na produção de feijão por habitante e 22% na produção de arroz, quando comparado com 2012.

O estudo também destaca o aumento significativo nos preços de alimentos essenciais. Frutas, hortaliças e cereais, por exemplo, tiveram aumentos que superaram a inflação geral, com as frutas subindo 299% e as hortaliças 246%. Esse cenário evidencia o impacto direto da menor produção de alimentos e a crescente demanda.

Políticas públicas e recomendação

A Carta do Ibre conclui que a alta nos preços dos alimentos não é um fenômeno passageiro e sugere políticas para garantir a segurança alimentar, como o foco nas culturas voltadas para o consumo interno, a recomposição dos estoques públicos e a melhoria das vias de escoamento e do crédito focalizado. Schymura também destaca que, embora o Brasil não deva restringir a produção de culturas de exportação, é fundamental estimular a produção adicional de alimentos.

Enquanto isso, o governo brasileiro tenta controlar a inflação de alimentos com medidas como a isenção de impostos sobre nove tipos de alimentos importados, além de esperar uma supersafra para este ano. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima que a safra de grãos 2024/25 será 10,3% maior que a anterior, o que poderia aliviar a pressão sobre os preços no curto prazo.

A alta nos preços dos alimentos, portanto, é um desafio multifacetado, com raízes tanto no contexto global quanto nas mudanças internas da economia brasileira. As políticas de incentivo à produção de alimentos, juntamente com a adaptação às mudanças climáticas, serão fundamentais para mitigar o impacto sobre a população, especialmente os mais pobres, que são os mais afetados pela inflação alimentar.

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