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sexta-feira, 5 de julho, 2024
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Editorial: A morte do Pantanal ocorre diante dos nossos olhos

Pode uma floresta inteira acabar? É possível uma planície, rica em água limpa, ser completamente tomada pelo fogo? Coisas narradas apenas em livros de ficção, retratados nos filmes hollywoodianos, estão sendo registradas hoje pelos noticiários e acompanhadas em tempo real pela internet. O Pantanal, o oceano de mata nativa no coração da América do Sul, tornou-se um deserto de cinzas ‘triste e sem vida’.

Aonde antes ecoava o gargalhar dos pássaros e se avistava a fauna na sua mais abundante diversidade, agora há o estalo do mato queimando e carcaças de animais mortos pelas chamas ou atropelados por veículos durante a desesperada tentativa de fuga para um local seguro, verde. Até mesmo os tuiuiús tiveram que deixar o ninho, após a árvore ser derrubada pelo fogo, junto aos três ovos da nova geração que não resistiram.

Os dados mais recentes divulgados pelo Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais, do Departamento de Meteorologia da UFRJ, apontam para a destruição de 721,2 mil hectares do Pantanal – e crescendo!. Deste total, 566,5 mil são do território sul-mato-grossense, a mesma federação brasileira que reluta em ter o nome alterado para Estado do Pantanal. Tão logo, essa polêmica será encerrada, já que o bioma caminha para a morte.

Ainda conforme os números, o primeiro semestre deste ano é considerado o mais devastador do Pantanal em toda a série histórica de registros do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Foram 3.538 focos de incêndio e 700 mil hectares atingidos de janeiro a junho, uma área quase seis vezes maior que a cidade do Rio de Janeiro. Os especialistas afirmam que algumas dessas áreas terão perdas irreversíveis.

Editorial: A morte do Pantanal ocorre diante dos nossos olhos
Foto: Divulgação/Corpo de Bombeiros

O Pantanal está cada vez mais seco e vulnerável. A sucessão de anos com poucas cheias e secas extremas poderá mudar permanentemente o ecossistema local, com consequências drásticas para a riqueza e a abundância de espécies de fauna e flora, com grandes impactos também na economia local, que depende da navegabilidade dos rios e da diversidade da vida selvagem.

Enquanto escrevo esse editorial há no Pantanal uma guerra contra um inimigo natural, mas cuja criação é humana. As forças estaduais e federais, trabalhadores de ONGs, Marinha, Exército, brigadistas voluntários e tantos outros combatentes trabalham 24h para acabar com as chamas e salvar o que ainda resta do bioma. Aviões, helicópteros, drones, veículos de diversos tipos estão sendo usados no combate ao fogo.

Pelos locais por onde a chama já passou, o cenário que surge é semelhante aos das maiores guerras armadas do mundo. Pelas redes sociais, o fotógrafo Guilherme Giovanni compartilhou um vídeo exibindo o local em que antes era uma coleção de árvores da espécie ipê-amarelo e agora é um amontoado de galhos caídos numa imensidão cinzas, “triste e sem vida”, conforme o mesmo descreveu na legenda do post.

Quem está discutindo a recuperação do pós-incêndio? A esperança de quem vive na floresta é a resiliência natural, a volta das grandes chuvas para fazer a vegetação nativa crescer e trazer novamente os animais e girar todo o processo natural da vida pantaneira. Mais do que legislações infiscalizáveis ou aplicação de multas que não serão pagas, é preciso urgentemente de um plano de reflorestamento antes que a própria natureza entregue os pontos e sucumba no sono eterno.

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