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sábado, 5 de outubro, 2024
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Em meio à recordes de queimadas, Capital ganha mural feito de cinzas transformadas em tintas 

Em chamas, o Pantanal registra uma queimada a cada 15 minutos e vive atualmente o que pode se tornar a crise de seca mais grave de sua história. Até último dia 28 de junho, 2.632 queimadas foram registradas. Com isto, o primeiro semestre já é o com maior número de focos de calor desde que o monitoramento foi iniciado, em 1998, pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O acumulado de 1º de janeiro até 28 de junho é de 3.531 queimadas. Já são quase 700 mil hectares destruídos em 2024, quase 5% de todo o bioma.

Em meio à recordes de queimadas, Capital ganha mural feito de cinzas transformadas em tintas 

Para chamar atenção ao tema e valorizar o importante trabalho dos brigadistas florestais voluntários no combate ao fogo, a cidade de Campo Grande ganha um mural de 114,4 m² pintado com tintas feitas de cinzas de queimadas de florestas brasileiras. A obra é do artista Victor Macaulin e foi dividida em 2 empenas, cada uma com 57,2 m², num prédio residencial de moradia popular no qual vivem  mais de 200 famílias, em Aero Rancho, terceiro bairro mais populoso da cidade. 

Natural de Campo Grande, Vitor utiliza o estilo de ilustração e realismo para dar voz às suas ideias. “A chegada do projeto na cena local vai impactar, já que abordar o tema ‘brigadistas florestais’ é algo novo na região. E fiquei feliz com a escolha do local, pois meu trabalho com graffiti é nos bairros periféricos da capital”, comenta o artista. 

Essa é a primeira obra da nova edição do Festival Paredes Vivas, uma iniciativa cultural e educativa que tem como objetivo incentivar a conscientização socioambiental, tendo a arte urbana como principal ferramenta, a partir da pintura de empenas de prédios em cidades do Brasil. 

Chamada de Cinzas da Floresta, esta é a segunda edição do festival, que passa também por Belém, Fortaleza, Goiânia e São Paulo, representando todos os biomas brasileiros. As obras são uma homenagem aos brigadistas florestais, que realizam um trabalho fundamental contra o fogo e pela preservação ambiental. O Festival Paredes Vivas – Edição Cinzas da Floresta é uma iniciativa da Parede Viva, com apoio da Rede Nacional de Brigadas Voluntárias (RNBV) e Mina Cultura. O patrocínio é da Yelum Seguradora, por meio da Lei de Incentivo à Cultura, do Ministério da Cultura. 

“O Brasil está em chamas e as brigadas florestais voluntárias são essenciais no combate a esses incêndios, principalmente no contexto de mudanças climáticas e descontrole de queimadas, muitas delas causadas de forma criminosa”, afirma o grafiteiro Mundano, fundador da Parede Viva e um dos idealizadores do projeto Cinzas da Floresta.

“O Mundano sempre usou a arte como ativismo, ou artivismo, como o mesmo chama. Em um dos grandes incêndios que aconteceram em 2020 na região do Pantanal, notou que uma forma de colaborar com a causa seria dar visibilidade ao tema por meio da arte. Assim nasce o projeto, com o intuito de denunciar esses índices alarmantes que, apesar da urgência, acabam sendo mais um número, com os dados virando paisagem. Agora, essas empenas é que passam a fazer parte da paisagem das cidades, sendo vistas por uma quantidade incontável de pessoas que circulam pelas ruas”, completa Roberta Youssef,  coordenadora do Festival. 

Oficinas

Além da empena, em todas as cidades são realizadas também oficinas com atividades de arte e educação, direcionadas a alunos de escolas públicas do entorno das empenas com a articulação de artistas locais para a realização de murais colaborativos. A oficina acontece em três etapas: exibição do filme “Cinzas da Floresta” (veja mais abaixo), seguida de debate e oficina de pintura com as cinzas no mural da escola; visita à empena pelos alunos participantes; avaliação das atividades. 

Em Campo Grande, a atividade aconteceu na última quinta-feira (4), com Erika Pedraza, oficineira que guiou as aulas para as crianças, e Alice Hellmann, artista responsável pela pintura do mural na escola. “Essa temática escolhida pelo projeto me traz a reflexão do quanto tudo é passageiro e efêmero. O fogo destrói, mas também renova. Das cinzas, a saudade do que foi perdido. O pó que tudo contém, o fogo que ninguém controla”, ressalta Alice. 

Das cinzas à tinta 

Durante os meses de maio a julho de 2024 foram coletadas cinzas de queimadas de todo o Brasil para transformar em pigmento. Para isso, foi realizada uma articulação com brigadas florestais, com apoio da Rede Nacional de Brigadas Voluntárias (RNBV). As cinzas foram coletadas em seus biomas e enviadas para a equipe do projeto. Depois da coleta, para chegar às tintas, são peneiradas em um processo que cria tonalidades como uma grande aquarela, com graus de diluição variados para contornos e cheios, e a posterior aplicação de um verniz solúvel em água.    

Parte do processo de fabricação das tintas foi registrado no documentário “Cinzas da Floresta”. Dirigido por André D’Elia, o filme acompanha uma viagem de Mundano, em 2021, por um Brasil em chamas para coletar as cinzas e produzir a tinta que foi usada em uma nova obra, “O Brigadista da Floresta”, em São Paulo, que deu origem ao projeto. 

Artivismo 

A primeira edição do Festival Paredes Vivas, realizada em 2021, aconteceu em cidades do estado de São Paulo: Piracicaba, com os artistas Sarah Soares e Diógenes Moura; Jundiaí, Bianca Foratori; Cotia, com Tamikuã Txihi, e São Paulo, com Adriano Vespa. 

Já o projeto Cinzas da Floresta, além do mural de Mundano, conta hoje com mais de 200 obras criadas por 152 artistas de 11 estados brasileiros, com o excedente da tinta da primeira viagem, e que deu origem à uma exposição em 2022. As obras foram vendidas e o valor arrecadado doado à RNBV.

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