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domingo, 2 de fevereiro, 2025
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MTE destaca desafios e estratégias para erradicação do trabalho escravo no Brasil

O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) reconhece que a erradicação do trabalho escravo contemporâneo no Brasil exige mais do que as ações repressivas que têm sido implementadas nas últimas três décadas. Em nota divulgada recentemente, o MTE destacou que, para acabar com a exploração de mão de obra em condições análogas à escravidão, é necessária uma “articulação com a sociedade civil” e uma série de iniciativas estruturais em áreas como educação, saúde e emprego, que complementem as ações de fiscalização e resgate.

O diagnóstico do MTE revela que o problema do trabalho escravo não é mais exclusivo de zonas rurais, mas também já se expande para ambientes urbanos. O setor da construção civil, por exemplo, teve o maior número de trabalhadores resgatados em 2024, com 293 pessoas, ou 14,6% do total de 2.004 resgates. Historicamente, esse tipo de exploração estava mais associado a atividades rurais, como a agricultura e pecuária.

Em mesas-redondas organizadas pelo MTE no Dia Nacional do Auditor-Fiscal do Trabalho e Dia Nacional do Combate ao Trabalho Escravo, especialistas e membros da sociedade civil enfatizaram que, embora a fiscalização seja eficaz na remoção de trabalhadores de condições análogas à escravidão, ela não é suficiente. O procurador Luciano Aragão Santos, do Ministério Público do Trabalho (MPT), ressaltou a importância de se ir além da repressão e focar também em prevenção, com base na coleta de dados e informações para tomar decisões mais eficazes.

Informação e Prevenção: Desafios e Falhas no Sistema

Uma das questões levantadas durante as discussões foi a falta de informações e dados sobre os trabalhadores resgatados, o que impede uma intervenção mais eficaz para prevenir reincidências de exploração. De acordo com Santos, das 63 mil pessoas resgatadas até 2023, 17,1 mil não estavam cadastradas no CadÚnico, o que significa que, mesmo após o resgate, muitos continuam fora do alcance de programas sociais como o Bolsa Família.

O frade dominicano Xavier Plassat, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), alertou que a falta de um atendimento adequado para os resgatados, bem como políticas públicas subfinanciadas, contribuem para a continuidade do ciclo de exploração, já que as vítimas frequentemente retornam às condições de vulnerabilidade.

Vulnerabilidade e Mudança nas Dinâmicas de Exploração

A advogada Laíssa Pollyana do Carmo, da Confederação Nacional dos Trabalhadores Assalariados e Assalariadas Rurais (Contar), destacou que a maior parte dos trabalhadores rurais está na informalidade, o que os torna mais vulneráveis à exploração. Nos estados da Bahia, Ceará, Maranhão, Pará e Piauí, mais de 80% dos trabalhadores rurais não têm carteira assinada, o que agrava a situação.

Além disso, a maior parte desses trabalhadores tem ocupação temporária, especialmente durante períodos de safra, o que aumenta a precariedade e a vulnerabilidade social. A falta de escolaridade também é um fator importante, com 11% dos trabalhadores sendo analfabetos e muitos não ultrapassando três anos de estudo.

Novas Dinâmicas e Ações Preventivas

Nos últimos anos, as dinâmicas do trabalho escravo mudaram, com novos fluxos migratórios e setores de exploração. A coordenadora da ONG Repórter Brasil, Natália Suzuki, observou que, enquanto no passado o Maranhão era o principal estado de origem dos trabalhadores resgatados no Pará, hoje, trabalhadores da Bahia estão sendo deslocados para Minas Gerais, especialmente para trabalhar nas lavouras de café. Para Natália, é urgente que as políticas públicas se adaptem rapidamente às mudanças nas dinâmicas de exploração, com um trabalho de inteligência e ações preventivas.

Monitoramento das Cadeias Produtivas e Responsabilidade Empresarial

A advogada Laíssa Pollyana do Carmo defendeu um maior acompanhamento das cadeias produtivas, especialmente nas áreas mais propensas à exploração, como a pecuária e as lavouras de soja, cana-de-açúcar, café, e milho. Para ela, é essencial que as empresas envolvidas nesses setores se responsabilizem pela fiscalização e pelas condições de trabalho de seus fornecedores.

O procurador Luciano Aragão Santos também ressaltou que as grandes indústrias precisam monitorar suas cadeias produtivas de forma mais eficaz, não apenas suspendendo as relações comerciais quando há violação dos direitos humanos, mas adotando medidas de prevenção e buscando reparação para os trabalhadores afetados.

A erradicação do trabalho escravo no Brasil exige uma ação coordenada entre governo, sociedade civil e setor privado, com políticas públicas abrangentes que tratem da prevenção, fiscalização e acompanhamento das vítimas, para garantir a dignidade e a justiça para todos os trabalhadores.

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