16/02/2015 13h00
Podemos perder todos os nossos arquivos digitais?
BBC Brasil
Seria possível perdermos todos os nossos registros históricos do século 21? O matemático e engenheiro de sistemas Vint Cerf, conhecido como “um dos pais da internet”, diz que é possível.
Cerf, que é o vice-presidente da empresa Google, diz estar preocupado com a ideia de perdermos todas as imagens e documentos que salvamos em computadores à medida em que hardwares e softwares se tornam obsoletos.
Em uma conferência científica em San Jose, na Califórnia, ele afirmou que o mundo pode entrar em uma “Idade das Trevas Digital” e que gerações futuras podem vir a ter poucos ou mesmo nenhum registro do século 21.
Durante o encontro anual da Associação Americana para o Avanço das Ciências, o engenheiro – que ajudou a definir como pacotes de dados se movem pela rede – diz que seu foco agora é resolver o problema que ameaça erradicar nossa história.
“Me preocupo muito. Já estamos passando por isso. Formatos antigos de documentos que criamos ou apresentações podem não ser legíveis pelas versões mais recentes dos softwares, porque a compatibilidade com versões anteriores não é sempre garantida”, disse à BBC.
Nossa vida, nossas memórias e nossas fotos de família mais queridas existem, cada vez mais, como bits de informação – em nossos discos rígidos ou “na nuvem”, mas, por causa da aceleração da revolução digital, há um risco de que elas se percam.
“O que pode acontecer ao longo do tempo é que mesmo se acumularmos arquivos enormes de conteúdo digital, pode ser que não saibamos mais o que é esse conteúdo.”
‘Pergaminho digital’
A solução proposta por Vint Cerf é preservar cada tipo de software e de hardware para que eles nunca se tornem obsoletos – da mesma forma que em um museu, só que em formato digital, em servidores na nuvem.
“A ideia é fazer uma espécie de raio-X do conteúdo, do programa em que ele pode ser aberto e do sistema operacional juntos, com uma descrição da máquina onde este sistema está funcionando, e preservá-lo por longos períodos de tempo. Esta foto instantânea digital irá recriar o passado no futuro”, explica.
Uma empresa, é claro, terá que oferecer este serviço, mas poucas empresas duraram centenas de anos. Então como podemos garantir que tanto nossas memórias pessoais quanto a história humana sejam preservadas? Não dá para garantir nem mesmo que o Google esteja existindo no próximo milênio.
“Certamente não, mas acho divertido imaginar que estamos no ano 3000 e você ainda faça pesquisas no Google. O ‘raio-X instantâneo’ que estamos tentando fazer poderia ser transportado de um lugar para outro. Eu poderia enviá-lo da nuvem do Google para outra nuvem, ou colocá-lo na máquina que estou usando”, diz Cerf.
“O importante aqui é a ideia de que, quando você mover esses bits de um lugar para o outro, ainda saiba como acessá-los corretamente e interpretar as partes diferentes. Tudo isso é possível se padronizarmos as descrições.”
“E esta é a questão – como posso assegurar no futuro distante que os padrões ainda sejam conhecidos e que possamos interpretar esse instantâneo digital?”
O engenheiro diz que o conceito, chamado de “pergaminho digital”, foi demonstrado pelo cientista da computação experimental Mahadev Satyanarayanan na Universidade Carnegie Mellon.
“Claro que há arestas a serem aparadas, mas já foi provado que o conceito geral funciona”, garante.